Acordo PS/Bloco de Esquerda na Câmara de Lisboa

É verdade que assim à primeira vista, custa apoiar um acordo PS/Bloco de Esquerda. Mesmo sendo para uma Câmara Municipal. O PS é sempre o PS, este PS. Com políticas de direita. Com ataques tremendos ao Estado social. A primeira tentação é pois dizer não. Mas é preciso ler o acordo. Ver as condições do acordo. E aí alto e pára o baile.

É um acordo surpreendente. Não estava nada à espera. Desde já, não tanto por o acordo em si, mas por o PS ter aceite todas as seis condições impostas pelo Bloco de Esquerda, para viabilizar um acordo, logo anunciadas na noite das eleições por José Sá Fernandes.

Em suma, o PS aceita completamente um programa de esquerda para governar a cidade de Lisboa. Sem margens para dúvidas, sem equívocos nenhuns, de forma surpreendente.

Vejamos as condições, em linhas gerais:

a) O cancelamento da permuta entre os terrenos privados do Parque Mayer, com parte dos terrenos municipais da Feira Popular, entregue à Bragaparques

b) A reestruturação das empresas municipais.

c) A implementação do plano verde do Arquitecto Ribeiro Teles.

d) A proibição de novos empreendimentos na zona ribeirinha.

e) A obrigação dos construtores arrendar ou vender 20% das casas a preços sociais

f) A não inclusão no acordo de forças ligadas à anterior governação.

Insisto em que o acordo é surpreendente. Porque um acordo é sempre a conciliação de vontade das partes. Implica cedências mútuas. O que vejo é uma cedência em toda a linha do PS. Não vislumbro cedências da parte do Bloco de Esquerda. Talvez as haja. Deve haver. Talvez para o orçamento camarário. Talvez para outras coisas menores.

Este acordo é também uma prova de fogo para o Bloco de Esquerda e para Sá Fernandes. Pela primeira vez o Bloco será confrontado com o exercício do poder em algumas áreas. Terá de demonstrar que é mais do que uma força do contra. Que tem ideias, tem propostas e tem coragem.

A direita não vê com bons olhos este acordo. É natural e já está a reagir. Um pequeno partido e um homem que afrontou os poderosos, da forma enérgica, vão tentar mostrar que não são bota-abaixistas, que não estão apenas no contra. A direita, os homens da construção, os poderosos, estão apavorados, com a presença de uma certa esquerda no poder. Compreendo-os.

Bom seria que a CDU (já disse que não, apesar de ter aceite pelouros noutros municípios conjuntamente com forças políticas, como o PSD, agora e no passado) e o movimento de Helena Roseta, integrassem o executivo, para uma governação com uma distintiva marca de esquerda.

Os meus parabéns ao Bloco de Esquerda. No momento em que pela primeira vez foi chamada a tomar uma posição difícil, soube agir com responsabilidade e sensatez, sem abdicar, nas grandes linhas fundamentais com o seu programa político e sem colocar em causa o seu papel de opositor implacável ao governo e às políticas de Sócrates.